20 de abril de 2008

Um aceno ao passado.

Não é que eu queira ser romântica, mas com o tempo descobri que saudosismo nasce com a gente, se desenvolve e multiplica. Diria até mais: cresce feita praga, erva daninha mesmo, sem remédio que dê conta.
E hoje me pego num desses dias em que a saudade é amarela, de doer. Convidada ao exercício da escrita – devo “cometer” uma crônica – o tema me reporta à infância e se há coisa danada para despertar esse sentimento acre-doce, é a tal primeira idade, a dos sonhos, a da vida que não passa e que, ao mesmo tempo, voa, afinal, quando nos damos conta já se foi o aniversário de quinze, a carteira de motorista por anos almejada está ficando poída e os fios prata entrelaçados aos cabelos já são em maior quantidade que há um tempo.
Mas há lago ainda pior: as pessoas que vão embora e levam consigo sonhos também nossos, outrora compartilhados, momentos vividos, ainda vívidos, ávidos por serem revistos. Às vezes mágoas, sim, que somos todos normais mas, acima disso, e entre tudo ficam as lembranças, as vivências, o que foi experimentado.
Então meu coração de menina grita num aceno ao passado e me vejo com doze anos, à noite, no quintal da casa, entre as árvores. Incumbida da tarefa de dar de comer ao gato, o medo me dominava. E isso acontecia todas as noites. Uma vez foi horrível: meu corpo magro e desengonçado de pré-adolescente eletrizou-se após ouvir um som forte. Parecia uma onça, juro!
Saí correndo, assombradíssima, para o aconchego e a claridade da casa, aos gritos, rezando, branca como cera. A seguir, morrendo de rir ele entra, me acalma, aconchega-me em seus fortes braços. Sinto seu calor, o cheiro da loção após barba e nossos corações tocam-se num enlace, ao mesmo tempo em que ouço sua voz melodiosa dizer-me: calma, calma, era só uma brincadeira.
Hoje já tenho filhos e eles também têm gatos. Nossa casa, um quintal com árvores bonitas e, quando os assusto nas noites, brincando de ser criança, sempre lembro dele. É, e vem aquela saudade doida de ti, meu pai.

Um comentário:

Anônimo disse...

É proofessora, parece que te inspiramos de novo! O assunto que comentamos na aula de hoje, quer dizer, ontem (meia-noite, já ._.), está aí na sua crônica. E ela ficou demaais! :) Quando comecei a ler, me lembrei da história da novela do fantasma, em que se assutasse quando visse a imagem da TV refletida na janela! OIEHOIEHOIEHEIOHEIOHE Escrever crônicas é legal, descobri isso depois que começamos a estudar também :D Beeijos, proo! :*